Mas para o mal temos muita habilidade.
Dissemos que o Pe. Diogo tem em casa uma amásia, que trouxe de Feirão. É falso.
Sua, nunca assaz chorada mãe, nunca
teve criada até à idade de 78 anos. Aqui perdeu as forças e sofria um pequeno
delírio. Por isso, seus filhos tomaram então uma servente para acompanhar a
pobre velha na amargura de seus dias derradeiros. Viveram unidas dez anos,
tempo em que o Pe. Diogo viveu fora de casa, entregue ao ministério paroquial.
Faleceu a mãe, e a sua criada caiu numa dupla enfermidade: dispepsia no
estômago e padecimento do peito. Como não tem bens nem pode trabalhar nem mendigar pelas
portas o sustento, era vítima da negra fome se fosse expulsa. Não tem , portanto,
uma amásia em casa, tem, sim, uma desgraçada a quem sustenta por esmola.
O Pe. Diogo não expôs filho algum,
como lhe imputámos. Acusámo-lo de um crime que ele não cometeu e que talvez
fosse indirectamente cometido por mim. Ouvi dizer que, aí pelo Arco, aparecera
à porta de uma casa habitada um infante abandonado, mas não sei quem expôs o
recém-nascido, nem o tal Casimiro argui o Pe. Diogo deste tão bárbaro
procedimento. Se eu nos meus panfletos, de tantas cores, quantas os pintores
sabem dar aos objectos que querem adornar, disse que o Pe. Diogo fora o que o
mandara colocar, isto foi num acesso de raiva canina, que muitas vezes me
combate. Esse menino era filho, não podia deixar de ser, de uma das mães a quem
eu arranquei do coração a crença religiosa. Não foi uma, foram muitas as
mulheres, que para chegar a meus depravados fins, e conseguir os meus danados
instintos, materializei, ensinando-lhes os inconsequentes dogmas dos Maniqueus
e Valdenses e negando-lhes a verdade da nossa santa religião. E estas pobres
mulheres, educadas por mim nos princípios erróneos da teologia pagã perverteram
outras.
Por direito eclesiástico são
excluídas do sacerdócio as mulheres; e porque obrou assim a Igreja? É porque as
mulheres, se fossem sacerdotisas, não tinham paciência nem força para calarem o
que soubessem pela confissão. Por isso, foram excluídas.
As minhas amásias, ensinadas por
mim, não se calaram, ensinaram a outras as minhas péssimas doutrinas: daqui o
haverem tantas mães sem fé, e daqui tantos abandonos de crianças.
*Transcrição do manuscrito "O abbade de Barrô e sua segunda confissão", datado de 25 de Novembro de 1889, procedendo-se apenas à actualização gráfica e a pequenas alterações, designadamente sinais de pontuação.