segunda-feira, 20 de julho de 2015

Confissões do Padre Eugénio César d'Azevedo, natural de Paus (10)*


Não é também verdade que o Pe. Diogo roubasse um Feliciano Monteiro, do Vale, vulgo o Feliciano. Eu, seu vizinho, sei que o Pe. Diogo comprou ao Feliciano um prédio, que justou por cem mil réis; que, tendo o vendedor recebido quase todo o preço da venda, se recusou a fazer o título sem que o Pe. Diogo lhe desse 30:000 réis a mais; e que finalmente concordaram que o Pe. Diogo lhe desse 15:000 réis. Fez-se o documento, e o Pe. Diogo deu ao vendedor,  além dos cem mil réis por que ajustaram, mais 15:000 réis, do que são testemunhas o Sr. Comendador Filipe José Rodrigues, José Rodrigues, da Eira-Velha. Não admira que o Feliciano calunie o Pe. Diogo, quem o conhece. Ouvi um trecho de sua vida.  Um dia este Feliciano, ainda moço, sofreu das mãos de seu pai um castigo, e o filho protestou vingar-se do pai, e assim fez.
Tinha o pai uma horta a partir com outra, pertencente ao Pe. António Pedro dos Santos, então Cura da freguesia, e o filho numa noite cortou todos os arbustos na horta do Padre, lembrando-se que este culpava no corte das árvores o seu pai, como culpou. Este Feliciano, que estando casado, possuía bastantes terrenos e ganhava pelo ofício de oleiro muito dinheiro, não fez caso de sua mãe e esta seria vítima da fome, se lhe não valesse outro filho. Nunca deu uma fatia de pão a um filho, que teve de uma mulher solteira, e vendeu seus terrenos para os não herdar uma filha, que tem legítima e muito pobre e com muitos filhos. Logo não é assombroso que um homenzinho assim levante uma calúnia a um inocente, mas é admirável que eu, que conheço este demónio, e sei que o Pe. Diogo o não roubou, o certifique ao público.
Pouco me resta para dizer por esta vez. Antes,  porém, que termine, digo e direi sempre que o Padre Diogo,   que  como homem há-de ter defeitos, como sacerdote imperfeições e como professor faltas, não é nem foi ladrão nem matador; logo, comparando-o nós no princípio dos nossos terceiros panfletos, cuja matéria é a mesma dos outros, com o tigre, o leão, o leopardo e a pantera, mostrámos que não temos ideia da história natural. Eu nunca a estudei, verdade e verdade. Cumpre-me também confessar que a loja, que me elegeu seu chefe nos papelitos a que me referi, diz que eu fui o mestre de todos os Padres de Paus, e que me não falta o invejável predicado de caritativo. Acharíeis estas expressões num estilo inchado? São estas verdades puras. 
*Transcrição do manuscrito "O abbade de Barrô e sua segunda confissão", datado de 25 de Novembro de 1889, procedendo-se apenas à actualização gráfica e a pequenas alterações, designadamente sinais de pontuação.
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